Adib D. Jatene
O doutor Jayme Murahovschi enviou e-mail tratando
da "tirania da urgência". Por outro lado, o noticiário da mídia
referente ao setor da saúde está concentrado em demora no atendimento da
emergência.As pessoas ficam horas aguardando para serem atendidas.
Frequentemente são crianças, e seus pais acumulam a sensação de impotência e
desproteção.Quando os pacientes são atendidos, acrescente-se, o são por
profissionais com quem não tiveram contato antes e que quase certamente não
verão mais.Isso é a negação da profissão médica, que se baseia no vínculo e na
responsabilidade de quem atende para com quem é atendido. A advertência, que
acompanha a receita e o pedido de exame, é a de que busque o seu médico, ou o
seu serviço de saúde, para o acompanhamento.O que ocorre é que esse paciente
não tem acesso nem a médico nem a serviço de saúde, razão por que buscou o
pronto-socorro, onde imagina ter a resolubilidade capaz de solucionar o seu
problema.Nessa situação, o que se verifica é que a maioria dos pacientes não
está com problema que o pronto-socorro possa resolver. Não são casos que exigem
providências radicais. Antes, são sintomas que necessitam de acompanhamento por
profissionais que já conhecem o paciente e que conseguem avaliar adequadamente
o seu problema.O plantonista tem a tendência natural, até para se proteger, de
receitar medicamentos e solicitar exames de utilidade discutível, que ampliam
gastos e geram novas preocupações, pela dificuldade de agendamento.Cabe
perguntar por que tudo isso acontece. A resposta vem sendo colocada há muito
tempo. Trata-se da falta de serviços básicos à disposição da população, mas
também de serviços especializados e leitos, que não têm relação com o número de
pessoas a serem atendidas.Em 1995, quando consolidamos o Programa de Saúde
da Família, colocando um médico, uma enfermeira e uma
auxiliar para tratar de cerca de 3.500 pessoas, simultaneamente pleiteamos
aumento de recursos que não poderiam ser atendidos pelo Orçamento. Buscamos
nova fonte na CPMF, prontamente esterilizada pela área econômica do
governo.Passados 18 anos, desde então, o que houve foi o agravamento da
situação.Em 1999, demonstrei que, apenas na cidade de São Paulo, faltavam 12
mil leitos, ou 60 hospitais de 200 leitos, e necessitávamos de pouco mais de
4.000 equipes de saúde da família. Hoje, a
deficiência de leitos na periferia continua. Apenas dois hospitais foram
construídos, o da Cidade Tiradentes e do M'Boi Mirim, e apenas 2.200 equipes
foram implantadas, algumas incompletas.O que precisamos é de uma nova fonte de
recursos, que seja seguramente vinculada para a saúde, capaz de suprir a
necessidade sentida há décadas.Várias propostas de melhoria de gestão, que
devem sim ser feitas, não têm o condão de substituir a massa de recursos de que
necessitamos e que, em um cálculo preliminar, significa dobrar o gasto que hoje
contamos no setor público.
Não se iluda o prefeito, que assume com as melhores
intenções: não há milagre a ser feito, mas recursos, e não pequenos, a ser
mobilizados. Caso contrário, a situação atual irá persistir e até se agravar.
ADIB D. JATENE, 83, cardiologista, é professor
emérito da USP e diretor-geral do Hospital do Coração. Foi ministro da Saúde
(governos Collor e FHC), secretário estadual da Saúde de SP (governo Maluf) e
diretor do InCor (nstituto do Coração)
Os artigos
publicados com assinatura não traduzem a opinião do jornal. Sua publicação
obedece ao propósito de estimular o debate dos problemas brasileiros e mundiais
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Fonte: Folha
de São Paulo, 21 de maio de 2013.
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